Diálogos de cinema & cultura audiovisual por mulheres realizadoras Diálogos de cinema & cultura audiovisual por mulheres realizadoras

SETE PERSONAGENS QUE AMAMOS (E SUA JORNADA PARA A MATURIDADE)

Existe algo sobre histórias de formação que mexe com as emoções do público. Talvez tenha algo a ver com o fato de que qualquer adulto tenha que passar pela experiência de alcançar a maturidade, o que faz das obras que exploram o tema especialmente tocantes e identificáveis. A universalidade das histórias de formação faz delas um assunto explorado repetidas vezes, mas, como de costume, as obras mais celebradas do gênero são protagonizadas garotos brancos tendo que lidar com a chegada da vida adulta. Não que Holden Caulfield não seja um personagem memorável, sua tentativa de fuga do mundo dos adultos é algo com que muitos podem se identificar, mas não podemos fingir que a sua experiência não está profundamente ligada ao seu sexo, cor e status social. Temos que parar de fingir que homens brancos heterossexuais são um padrão em que todos podem se ver. É verdade que pessoas de grupos minoritários – mulheres, negros, asiáticos, gays – acabam por ter que se identificar com ou no mínimo conhecer essas histórias simplesmente porque elas estão em todos os lugares e formam o cânone da arte ocidental. Mulheres que estudam e se interessam por literatura são obrigadas a ler livros de autores celebrados que eram extremamente misóginos. Cineastas negros têm que saber que O Nascimento de Uma Nação, um dos filmes que  marcaram o cinema, glorifica a criação da Ku Klux Klan. Estudar arte, pertencendo a um grupo minoritário, é, muitas vezes, uma experiência masoquista. E isso não começa com os livros e filmes racistas, misóginos e homofóbicos, vem de algo muito mais sutil e insidioso, da experiência de sermos forçados a nos identificar homens brancos e heterossexuais enquanto continuamos a ser desumanizados pela nossa invisibilidade. Essa lista vem como uma tentativa de abrir horizontes, mostrar novas histórias, dizer: estamos aqui. Existimos.

Rae de My Mad Fat Diary

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Os médicos olharam pras minhas pernas e disseram ‘não doeu? Não doeu tanto quando você estava fazendo que queimava respirar?’ Pelo menos elas me lembram que eu sobrevivi. Mas por pouco.

Depois de passar quatro meses numa clínica de recuperação após uma tentativa de suicídio, Rae tem que voltar a conviver com os amigos e a mãe ao mesmo tempo que lida com seus problemas de auto-imagem, depressão e ansiedade. A série trata de diversos assuntos que haviam sido explorados de forma muito tímida por outras séries adolescentes anteriores. A obesidade e o aborto são temas abordados com sensibilidade e consciência, promovendo um debate pertinente e muito honesto. Sem falar da forma sarcástica, cômica e crua que Rae vê o mundo, ela é um presente para espectadores que desejavam uma voz inovadora, engraçada e real.

Shizuku de Whisper of the Heart

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Deve ser ótimo saber o que você quer fazer. Eu não faço a mínima ideia, só vou de um dia pro outro.

É seu último ano do ensino fundamental e Shizuku está pronta pra aproveitar o verão e ler todos os livros de fantasia que encontrar na biblioteca. Não demora muito pra ela perceber que todos os livros que ela pega foram lido antes por um tal Seiji Amasawa, que ela acaba por conhecer e, aos trancos e barrancos, se tornar amiga. Ao descobrir sobre o desejo de Seiji de seguir sua paixão pela confecção de violinos, Shizuku é inspirada a pensar em seus próprios desejos para o futuro e descobrir suas próprias aspirações: tornar-se escritora. Apesar de seus medos e incertezas, Shizuku se entrega completamente à empreitada de escrever sua primeira história, por vezes negligenciando a escola, o que preocupa seus pais. Whisper of the Heart apresenta comentários interessantes não só sobre a procura dos sonhos, mas também sobre o expectativas da sociedade japonesa quanto a escola e busca de carreiras criativas.

Wadjda de O Sonho de Wadjda

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Você, tímida? Quem dera!

Tudo que a pequena e rebelde Wadjda quer é uma bicicleta verde para apostar corrida com o amigo e, depois da recusa da mãe, ela sabe que a única forma de alcançar seu objetivo é utilizar suas próprias habilidades para arrecadar dinheiro e comprar a bicicleta ela mesma. A trama do filme é simples e simbólica. Além de ter sido o primeiro longa-metragem inteiramente filmado na Arábia Saudita, O Sonho de Wadjda foi também o primeiro filme dirigido por uma mulher saudita, sua história aparentemente simples, protagonizadas por mulheres em uma sociedade misógina, mas que continuam a lutar pelos seus direitos e desejos como podem, ganha um aspecto de resistência quando colocado em uma perspectiva histórica.

Estela de Califórnia

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Ah, Estela… Todo mundo tem problemas. É que a gente só repara nos nossos.

O primeiro longa-metragem de ficção de Marina Person conta a história de uma adolescente que sonha em fugir. Fugir de um país sob um governo ditatorial, fugir do pai tirânico, fugir da sua primeira menstruação, que, segundo o mundo, indicava que ela havia se tornado mulher. Ao som de The Cure, Paralamas do Sucesso e Joy Division, vemos Estela descobrir que aquele sangue quatro anos antes nada tinha a ver com se tornar mulher. Vemos sua jornada para a maturidade se desenrolar em livros, amores e desamores, a morte de uma pessoa querida e sua primeira experiência sexual.

Angela de My So-Called Life

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As pessoas dizem o tempo todo que você deveria ser você mesmo, como se você mesmo fosse essa coisa definida, como uma torradeira. Como se você soubesse o que é.

Falar da história de maturação de Angela Chase é um tanto quando irônico porque ela nunca acabou. A série que ela protagonizou em meados da década de 90 nunca viu a luz da segunda temporada devido a sua baixa audiência, mas desde então a série ganhou legiões de fãs e se tornou um clássico cult. Isso provavelmente se deve ao fato que a série, até hoje, ressoa profundamente com o público adolescente devido a sinceridade da sua personagem principal, Angela, entre a angústia com o fim de antigas amizades, a criação de novos laços, problemas com os pais e paixonites adolescentes, vemos diversas reflexões de Angela que por vezes hilárias e comoventes e fazem de My So-Called Life uma série memorável.

Alike de Pariah

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Um coração partido se abre para o nascer do sol porque até a ferida é uma abertura e eu estou partida, eu estou aberta.

A adolescência é uma época difícil para qualquer um, mas pode ser especialmente dura para uma adolescente negra e lésbica encarando e abraçando a sua própria sexualidade dentro de uma família religiosa. Alike tem que lidar tanto com problemas corriqueiros da idade como brigas com a melhor amiga quanto a homofobia profundamente enraizada da mãe enquanto descobre sua própria identidade e percorre o caminho tortuoso para a vida adulta. Desde as roupas que usa até a pessoa por quem ela vem se apaixonar fazem parte de um processo de auto-aceitação e busca de pertencimento que culminam numa ruptura dolorosa e necessária com a família e a infância.

Malcolm de Dope

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Para a maioria dos geeks, um dia ruim pode ser uma piada durante a aula, a ocasional pegadinha com sua comida e, no pior dos casos, levar uma surra dos atletas. Mas quando se mora nos Bottoms, um dia ruim é ser morto por acidente.

No seu último ano do ensino médio, Malcolm Adekanbi ainda está tentando conciliar a sua identidade como um aluno nota 10 com pretensões de entrar em Harvard com a forma que o mundo o vê: um jovem negro criado na periferia de Los Angeles por uma mãe solteira. Em meio a sua busca por fugir dos estereótipos e encontrar o seu lugar no mundo, ele alimenta sua obsessão por cultura hip hop dos anos 90 e toca com seus dois melhores amigos em uma banda punk. Depois de se envolver acidentalmente em uma briga de gangues, ele terá de lidar com tudo que faz parte da sua identidade, inclusive aquilo que ele rejeita.